Slides pratica leitora multimidial

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segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Pechada- Crônica de Luis Fernando Veríssimo e ilustração de Santiago.

 


    O apelido foi instantâneo. No primeiro dia de aula, o aluno novo já estava sendo chamado de "Gaúcho". Porque era gaúcho. Recém-chegado do Rio Grande do Sul, com um sotaque carregado.

– Aí, Gaúcho!

– Fala, Gaúcho!

     Perguntaram para a professora por que o Gaúcho falava diferente. A professora explicou que cada região tinha seu idioma, mas que as diferenças não eram tão grandes assim. Afinal, todos falavam português. Variava a pronúncia, mas a língua era uma só. E os alunos não achavam formidável que num país do tamanho do Brasil todos falassem a mesma língua, só com pequenas variações?

– Mas o Gaúcho fala "tu"! – disse o gordo Jorge, que era quem mais implicava com o novato.

– E fala certo - disse a professora. – Pode-se dizer "tu" e pode-se dizer "você". Os dois estão certos. Os dois são português.

      O gordo Jorge fez cara de quem não se entregara.

      Um dia o Gaúcho chegou tarde na aula e explicou para a professora o que acontecera.

– O pai atravessou a sinaleira e pechou.

– O que?

– O pai. Atravessou a sinaleira e pechou.

       A professora sorriu. Depois achou que não era caso para sorrir. Afinal, o pai do menino atravessara uma sinaleira e pechara. Podia estar, naquele momento, em algum hospital. Gravemente pechado. Com pedaços de sinaleira sendo retirados do seu corpo.

– O que foi que ele disse, tia? – quis saber o gordo Jorge.

– Que o pai dele atravessou uma sinaleira e pechou.

– E o que é isso?

– Gaúcho... Quer dizer, Rodrigo: explique para a classe o que aconteceu.

– Nós vinha...

– Nós vínhamos.

– Nós vínhamos de auto, o pai não viu a sinaleira fechada, passou no vermelho e deu uma pechada noutro auto.


      A professora varreu a classe com seu sorriso. Estava claro o que acontecera? Ao mesmo tempo, procurava uma tradução para o relato do gaúcho. Não podia admitir que não o entendera. Não com o gordo Jorge rindo daquele jeito.

      "Sinaleira", obviamente, era sinal, semáforo. "Auto" era automóvel, carro. Mas "pechar" o que era? Bater, claro. Mas de onde viera aquela estranha palavra? Só muitos dias depois a professora descobriu que "pechar" vinha do espanhol e queria dizer bater com o peito, e até lá teve que se esforçar para convencer o gordo Jorge de que era mesmo brasileiro o que falava o novato. Que já ganhara outro apelido: Pechada.

– Aí, Pechada!

– Fala, Pechada!

Pra mim, pra ti...

     Quando cursávamos pós- graduação em Leitura e Produção de texto, fomos alunas da doutora Lúcia Villela. Gaúcha, fez doutorado no Rio de Janeiro, e contava-nos várias situações engraçadíssimas pelas quais passou em função das diferenças dialetais. O uso de tu e você ocasionou uma dessas histórias.
    Certa vez, ao encontrar um menino, filho de conhecidos seus, ofereceu-lhe três bombons e instruiu:
_ É um para a tua mana, um para o teu mano e um para ti.
_ Mas e para mim? Indagou o menino já com cara de triste.
_ Sim, aqui está. Um para o mano, um para a mana e um para ti.
_ Mas e para mim? Repetiu o menino, já começando a chorar.
Após alguns minutos de repetição desse diálogo e de muitas lágrimas derramadas pelo menino, a doutora Lúcia deu-se conta do problema e consertou:
_ É um para o mano, um para a mana e um para você.
O menino parou de chorar imediatamente, e correu para dividir os bombons com os irmãos. Até então, talvez pensasse que “ti” fosse uma outra pessoa...



sexta-feira, 26 de novembro de 2010

ATIVIDADE DO BLOG - MODULO 3 - UNIDADE 1


No ônibus


Luisão é um amigo que chegou de São Paulo em Bagé. Logo na sua chegada, enquanto íamos pra casa de ônibus, um acidente aconteceu em plena General Osório.

Eu apavorado gritei:
- É uma pechada!!!

Luisão me olhou espantadíssimo, procurando a tal pechada por todos os lados.
Não entendendo a confusão que estava fazendo na cabeça de meu amigo, me dirigi a ele pedindo:
- Ajude aquele senhor que ficou preso na roleta!

Mais uma vez Luizão me olhou de forma estranha. E eu apontei o senhor que estava preso. Foi então que meu amigo entendeu o que estava querendo dizer, era pra ele ajudar o senhor que ficara preso na catraca.

Assim que tudo finalmente se resolveu, voltávamos pra casa conversando sobre o acontecido e eu fiz o seguinte comentário:
- Bagé realmente necessita de mais sinaleiras!

O amigo mais uma vez fez uma cara de desconhecimento e disse a mim:
- É, pelo jeito vou precisar de um dicionário “ bagenes”!


Vocabulário:
Pechada - batida;
Roleta – catraca;
Sinaleira – semáforo.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Por um coração mais arejado. Ana Jácomo.


"Muitas vezes eu também já me perguntei se adianta a gente se empenhar para abrir o coração num tempo de tantos corações rigidamente trancados, em que o medo parece dar as cartas e descartar possibilidades de troca, espontaneidade e amor.

Houve instantes em que duvidei e me questionei se não seria mais seguro, mais tranquilo, mais fácil, tentar interromper o fluxo e fechar o meu coração de novo. No máximo, deixar apenas uma fresta aberta por onde espiar a vida de longe.

Embora não seja necessariamente mais seguro, mais tranquilo, muito menos mais fácil, continuo sentindo que é bem mais leve, alegre e desapertado viver com o coração mais aberto. Sobretudo, para nós mesmos. Ainda que às vezes a gente sinta estar na contramão. Ainda que às vezes esse nos pareça ser um movimento solitário.

No mínimo, corre mais vento."

Quando li este texto, imediatamente lembrei dos meus alunos. Eu também já me perguntei inúmeras vezes de que adianta, porque o retorno que vem deles é pouco, às vezes nem vem... Mas concordo que o coração deve estar sim, sempre aberto. 
Então, tenho saído de casa todas as manhãs com os bolsos cheios de beijos e abraços para os que quiserem receber. Começaram tímidos, mas agora os alunos já fazem fila para o bom-dia. Nossa amizade se cristaliza. E minhas palavras já tocam mais fundo. E meus ensinamentos já surtem mais efeitos. E meu exemplo ficará gravado. 
Nesta troca, nesta simpatia, encontro forças para seguir tentando. Encontro brechas importantes e vou por elas. 
Aproximar-se do aluno, ouví-lo, conquistá-lo, conhecer o que de importante há sobre sua vida são fatores determinantes para a introdução à leitura. 
É necessário cuidar com carinho das sementes literárias, escolhê-las com cuidado, para que floresçam nessas almas. Regar diariamente, trazer sempre um novo adubo, podar quando necessário, são atos que não podem faltar nesse cultivo.
Com carinho.

Ana Jácomo, sugestão de leitura para alunos e professores.

Hoje eu não quero conversas vestidas de uniforme. Diálogos impecavelmente arrumados que não deixam o coração à mostra. As palavras podem sair de casa sem maquiagem. Podem surgir com os cabelos desalinhados, livres de roupas que as apertem, como se tivessem acabado de acordar. Dispensa-se tons acadêmicos, defesas de tese, regras para impressionar o interlocutor. O único requinte deve ser o sentimento. É desnecessário tentar entender qualquer coisa. Tentar solucionar qualquer problema. Buscar salvamento para o quer que seja.

Hoje eu não quero falar sobre o quanto o mundo está doente. Sobre como está difícil a gente viver. Sobre as milhares de coisas que causam câncer. Sobre as previsões de catástrofes que vão dizimar a humanidade. Sobre o quanto o ser humano pode ser também perverso, corrupto, tirano e outras feiúras. Sobre os detalhes das ações violentas noticiadas nos jornais. Não quero o blablablá encharcado de negatividade que grande parte das vezes não faz outra coisa além de nos encher de mais medo. Não quero falar sobre a hipocrisia que prevalece, sob vários disfarces, em tantos lugares. Hoje, não. Hoje, não dá. Não me interessam o disse-que-disse, os julgamentos, a investigação psicológica da vida alheia, os achismos sobre as motivações que fazem as pessoas agirem assim ou assado, o dedo na ferida.

Hoje eu não quero aquelas conversas contraídas pelo receio de não se ter assunto. A aflição de não se saber o que fazer se ele, de repente, acabar. O esforço de se falar qualquer coisa para que a nossa quietude não seja interpretada como indiferença. Hoje eu não quero aquelas conversas que muitas vezes acontecem somente para preenchermos o tempo. Para tentarmos calar a boca do silêncio. Para fugirmos da ameaça de entrar em contato com um monte de coisas que o nosso coração tem pra dizer. Além do necessário, hoje não quero falar só por falar nem ouvir só por ouvir. Que a fala e a escuta possam ser um encontro. Um passeio que se faz junto. Um tempo em que uma vida se mostra para a outra, com total relaxamento, sem se preocupar se aquilo que é mostrado agrada ou não. Se aumenta ou diminui os índices de audiência.

Hoje, se quiser, se puder, se souber, me fala de você. Da essência vestida com essa roupa de gente com a qual você se apresenta. Fala dos seus amores, tanto faz se estão perto do seu corpo ou somente do seu coração. Fala sobre as coisas que costumam fazer você sintonizar a frequência do seu riso mais gostoso. Fala sobre os sonhos que mantêm o frescor, por mais antigos que sejam. Fala a partir daquilo em você que não desaprendeu o caminho das delícias. Do pedaço de doçura que não foi maculado. Da porção amorosa que saiu ilesa à própria indelicadeza e à alheia. A partir daquilo em você que continuou a acreditar na ternura, a se encantar e a se desprevenir, apesar de tantos apesares. Conta sobre as receitas que lhe dão água na boca. Sobre o que gosta de fazer para se divertir. Conta se você reza antes de adormecer.

Hoje, me fala de você. Dos momentos em que a vida lhe doeu tanto que você achou que não iria aguentar. Fala das músicas que compõem a sua trilha sonora. Dos poemas que você poderia ter escrito, de tanto que traduzem a sua alma. Senta perto de mim e mesmo que estejamos rodeados por buzinas, gente apressada, perigos iminentes, faz de conta que a gente está conversando no quintal de casa, descascando uma laranja, os pés descalços, sem nenhum compromisso chato à nossa espera. A gente já brincou tanto de faz-de-conta quando era criança, onde foi que a gente esqueceu como se chega a esse lugar de inocência? Fala da lua que você admirou outra noite dessas, no céu. Da borboleta que lhe chamou à atenção por tanta beleza, abraçada a alguma flor, como se existisse apenas aquele abraço. Diz se quando você acorda ainda ouve passarinhos, mesmo que não possa identificar de onde vem o canto. Diz se a sua mãe cantava para fazer você dormir.

Senta perto e me conta o que você sentiu quando viu o mar pela primeira vez e o que sente quando olha pra ele, tantas vezes depois. Se tinha jardim na casa da sua infância, me diz que flores riam por lá. Conta há quanto tempo não vê uma joaninha. Se tinha algum apelido na escola. Se consegue se imaginar bem velhinho. Fala da sua família, a de origem ou a que formou. Das pessoas que não têm o seu sobrenome, mas são familiares pra sua alma. Fala de quem passou pela sua vida e nem sabe o quanto foi importante. Daqueles que sabem e você nem consegue dizer o tamanho que têm de verdade. Fala daquele animal de estimação que deitava junto aos seus pés, solidário, quando você estava triste. Diz o que vai ser bacana encontrar quando, bem lá na frente, olhar para o caminho que fez no mundo, em retrospectiva.

Podemos falar abobrinhas, desde que sejam temperadas com riso, esse tempero que faz tanto bem. A gente pode rir dos tombos que você levou na rua e daqueles que levou na vida, dos quais a gente somente consegue rir muito depois, quando consegue. A gente pode rir das suas maluquices românticas. Das maiores encrencas que já arrumou. Das ciladas que armaram para você e, antes de entender que eram ciladas, chegou até a agradecer por elas. De quando descobriu como são feitos os bebês. A gente pode rir dos cárceres onde se prendeu e levou um tempo imenso pra descobrir que as chaves estavam com você o tempo todo. Das vezes em que se sentiu completamente nu diante de um Maracanã, tamanha vergonha, como se todos os olhos do mundo estivessem voltados na sua direção. Das mentiras que contou e acreditaram com facilidade. Das verdades que disse e ninguém levou a sério.

Não precisa ter pauta, seguir roteiro, deixa a conversa acontecer de improviso, uma lembrança puxando a outra pela mão, mas conta de você e deixa eu lhe contar de mim. Dessas coisas. De outras parecidas. Ouve também com os olhos. Escuta o que eu digo quando nem digo nada: a boca é o que menos fala no corpo. Não antecipe as minhas palavras. Não se impaciente com o meu tempo de dizer. Não me pergunte coisas que vão fazer a minha razão se arrumar toda para responder. Uma conversa sem vaidade, ninguém quer saber qual história é a mais feliz ou a mais desditosa.
Hoje eu quero conversar com um amigo pra falar também sobre as coisas bacanas da vida. As miudezas dela. A grandeza dela. A roda-gigante que ela é, mesmo quando a gente vive como se estivesse convencido de que ela é trem-fantasma o tempo inteiro. Um amigo pra falar de coisas sensíveis. Do quanto o ser humano pode ser também bondoso, honesto, afetuoso, divertido e outras belezas. Dos lugares onde nossos olhos já pousaram e daqueles onde pousam agora. Um amigo para conversar horas adentro, com leveza, de coisas muito simples, como a gente já fez mais amiúde e parece ter desaprendido como faz. Um amigo para se conversar com o coração.

E se não quisermos, não pudermos, não soubermos, com palavras, nos dizer um pouco um para o outro, senta ao meu lado assim mesmo. Deixa os nossos olhos se encontrarem vez ou outra até nascer aquele sorriso bom que acontece quando a vida da gente se sente olhada com amor. Senta apenas ao meu lado e deixa o meu silêncio conversar com o seu. Às vezes, a gente nem precisa mesmo de palavras.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

A escolha da música.

Acreditamos em três expressões básicas nesta melodia: " Não ter vergonha de ser feliz.", " Ser um eterno aprendiz." e "Pureza da resposta da criança." Pensamos que isso traduz tudo , o ser humano feliz é aquela que não tem medo de ser feliz. Quem é o bom professor senão um eterno aprendiz? E principalmente a razão de sermos educadores: nossos alunos , com suas respostas e colocações , muitas vezes sem maldade, com a pureza que só as crianças sabem demonstrar.

Clipe - " O que é , o que é?

O Que É, O Que É?

Gonzaguinha

Composição: Gonzaguinha

Eu fico
Com a pureza
Da resposta das crianças
É a vida, é bonita
E é bonita...
Viver!

E não ter a vergonha
De ser feliz
Cantar e cantar e cantar
A beleza de ser
Um eterno aprendiz...
Ah meu Deus!

Eu sei, eu sei
Que a vida devia ser
Bem melhor e será
Mas isso não impede
Que eu repita
É bonita, é bonita
E é bonita...
E a vida!

E a vida o que é?
Diga lá, meu irmão
Ela é a batida
De um coração
Ela é uma doce ilusão
Hê! Hô!...
E a vida

Ela é maravilha
Ou é sofrimento?
Ela é alegria
Ou lamento?
O que é?
O que é?
Meu irmão...
Há quem fale

Que a vida da gente
É um nada no mundo
É uma gota, é um tempo
Que nem dá um segundo...
Há quem fale

Que é um divino
Mistério profundo
É o sopro do criador
Numa atitude repleta de amor...
Você diz que é luxo e prazer

Ele diz que a vida é viver
Ela diz que melhor é morrer
Pois amada não é
E o verbo é sofrer...
Eu só sei que confio na moça

E na moça eu ponho a força da fé
Somos nós que fazemos a vida
Como der, ou puder, ou quiser...
Sempre desejada

Por mais que esteja errada
Ninguém quer a morte
Só saúde e sorte...
E a pergunta roda

E a cabeça agita
Eu fico com a pureza
Da resposta das crianças
É a vida, é bonita
E é bonita...